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O Pelourinho de Curitiba, ou o que restou dele

O mês de maio marca o mês em que se comemora a abolição da escravidão no Brasil. Em 13 de maio de 1888, a Princesa Izabel assinou a Lei Áurea, que garantiu o fim do trabalho escravo no Brasil. É necessário ressaltar que embora essa seja a data oficial, ela não deve ser a única a ser lembrada. Para que se chegasse a esse ponto, houve muita luta por parte da população negra e escravizada, e por diversos outros segmentos sociais.


Tendo em vista essa temática, escreveremos sobre locais da cidade de Curitiba que possuem relação com a época escravocrata.


No presente texto, falaremos sobre a Praça Borges de Macedo, local em que antigamente estava localizado o pelourinho de Curitiba.


O que eram os pelourinhos


O pelourinho era uma coluna de pedra ou de madeira, instalada geralmente em praças centrais das cidades e vilas, com o objetivo de ser o símbolo da justiça — e local de castigos físicos aos criminosos e aos negros escravizados. No Brasil Colônia, os pelourinhos representavam o poder da coroa portuguesa, e além disso serviam como marco zero das vilas — o perímetro delas, chamado de rocio, era calculado a partir do pelourinho, sendo 1,5 km a distância entre ele e cada uma das extremidades da vila.

O pelourinho de Curitiba 


É mais antigo do que a própria cidade. Foi instalado em 4 de novembro de 1668 por Gabriel de Lara, Capitão Mor e Procurador do Marquês de Cascais, Senhor das Terras da Capitania de Paranaguá (Curitiba só foi alçada à condição de vila 25 anos depois, em 1693). Essa informação nos é trazida em uma placa na Praça Borges de Macedo numa pedra comemorativa, instalada em 1968.

Segundo historiador Ermelino de Leão, citado por Rafael Greca, o pelourinho de Curitiba “era um madeiro grosso, lavrado com 4 faces, com as insígnias de 4 argolas de ferro e braços para o alto, tendo no alto como remate um cutelo”. Teria apodrecido com o tempo, e logo foi substituído por outro.

Não coincidentemente, no mesmo local, entre o pelourinho e a Praça Tiradentes, em 1726, foi construída a Casa de Câmara de Cadeia — era costume, no Brasil colonial, a igreja, o pelourinho e a Casa de Câmara e Cadeia estarem próximos, representando o poder espiritual, judiciário e municipal, respectivamente. Sua construção estava entre as determinações do representante da Coroa Portuguesa Ouvidor Pardinho, em sua passagem por Curitiba em 1721.


O prédio de dois andares abrigava funções administrativas diversas, como a de Câmara Municipal no piso superior, e a de cadeia no piso inferior.

Durante quase 200 anos, a Casa de Câmara de Cadeia foi o símbolo do poder público da cidade de Curitiba. Tamanha sua importância, ela contribuiu para diversos avanços tecnológicos da cidade como um todo. Por exemplo, as primeiras ações de iluminação pública de Curitiba nasceram da demanda de uma melhora na segurança do prédio - em 1848 foram trazidos do Rio de Janeiro e instalados em Curitiba vinte lampiões.


Quem liderou essa iniciativa foi o à época vereador José Borges de Macedo. Borges de Macedo, que hoje dá nome à Praça, foi também o primeiro administrador de Curitiba entre os anos de 1833 e 1835 - em um cargo similar ao que seria o de prefeito atualmente.


O edifício da Casa de Câmara e Cadeia apresentava inúmeros problemas — e as condições eram insalubres. Tanto que, em 1898, após um incêndio, o prédio foi desativado para então ser demolido em 1900. No mesmo local foi construído um edifício de três andares que pertencia à família Hoffman, e que anos depois também foi demolido.

O pelourinho, entretanto, havia sido demolido muitos anos antes. Ao que tudo indica, segundo o historiador Rocha Pombo, o pelourinho foi demolido às vésperas da Independência do Paraná, em 1853, num período em que o passado colonial já era mal visto — e que o próprio pelourinho já não era mais utilizado.


Memória do pelourinho em Curitiba


Quando se fala em Pelourinho, muitos podem achar que ele existia apenas no Nordeste, em cidades como Salvador, e que não era coisa de cidades do Sul do Brasil, como o caso de Curitiba. Isso, no entanto, não é verdade. Mas não é por acaso que essa seja a impressão para muitas pessoas. Pelo contrário, existem muitas explicações pra isso, e talvez uma das principais seja a memória.


Tomemos como exemplo a cidade já citada e que possui o pelourinho mais famoso do Brasil, que virou até nome de bairro - Salvador. Na lista de quase todos que visitam a capital baiana, o Pelourinho aparece como um dos destinos principais, se não o principal. Quando tratamos do de Curitiba, no entanto, muitos passam pela cidade sem nem saber que existiu ali também um pelourinho.


Parte disso se deve à não preocupação do poder público, já na época imperial, em fazer referência explícita ao fato de que ali estava o antigo pelourinho da cidade de Curitiba. Até hoje, o passado colonial, a existência da escravidão e de práticas de violência pelo estado parecem ser um tabu para memória oficial de Curitiba, que trata de apagá-los.


Há, é verdade, como já citado, uma pedra com um placa comemorativa com a informação de que ali havia o pelourinho de Curitiba, instalada em 1968. No entanto, poucas pessoas param para ler a placa, e ela chama menos atenção do que poderia chamar uma réplica do pelourinho, o próprio pelourinho preservado, ou o nome da praça levar o nome de Pelourinho.


Em vez de usar o espaço para lembrar de que existiu escravidão em Curitiba, que pessoas negras escravizadas foram ali açoitadas e humilhadas em praça pública, foi decidido, após a abertura daquele pequeno espaço entre a Praça Tiradentes e a Generoso Marques, que ele levaria o nome de um político de uma família tradicional.


Atualmente, há somente duas referências ao pelourinho de Curitiba: as Arcadas do Pelourinho, um espaço criado na década de 1990 que fica na Praça Borges de Macedo — onde atualmente funciona o Mercado das Flores; e a obra de Sérgio Ferro, pintada no teto do Memorial de Curitiba.


Com esses apontamentos, não estamos diminuindo a importância de Borges de Macedo e da praça em sua homenagem para a cidade de Curitiba. Somente estamos indicando que existem outras possibilidades de homenageá-lo, como em outras praças ou ruas, sem fazer com que o antigo Pelourinho —  símbolo de uma época e de um Brasil —  seja esquecido.


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